Vida e família

União de facto e casamento: as diferenças legais

Quer dar um passo de formalizar a sua união, mas tem dúvidas de qual é a melhor solução? Saiba as diferenças entre união de facto e casamento

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União de facto e casamento: as diferenças legais

Quer dar um passo de formalizar a sua união, mas tem dúvidas de qual é a melhor solução? Saiba as diferenças entre união de facto e casamento

A união de facto é uma situação jurídica. Dizemos-lhe em que consiste, o que precisa para ser legal e quais os direitos que a lei prevê, comparando-a com o casamento.

Casamento e união de facto são duas formas de "oficializar" uma relação, a primeira mais formal que a segunda. A lei tem vindo a aproximar os direitos em ambas as situações, mas continuam a existir diferenças na produção de efeitos de cada uma, persistindo o prejuízo da união de facto:

Principais diferenças entre a união de facto e o casamento

  • na união de facto não existe um regime de bens que permita a divisão do património na separação de acordo com a vontade expressa pelo casal, como acontece com o matrimónio. No limite, e em caso de conflito, um membro pode ter que devolver bens ao outro. Quem fica com a casa de morada da família é decidido nos termos do Código Civil;
  • em caso de morte, o membro sobrevivo não é considerado seu legítimo herdeiro, contrariamente ao viúvo no regime do casamento, sem prejuízo da proteção da casa de morada da família e do acesso a prestações sociais, como o subsídio por morte e pensão de sobrevivência;
  • a partilha de apelidos está vedada aos unidos de facto;
  • o filho nascido de uma união de facto tem que ser voluntariamente reconhecido pelo pai ou, num caso limite, haver lugar a uma investigação de paternalidade, ao invés do casamento, onde esse reconhecimento é automático;
  • a aquisição da nacionalidade portuguesa é mais exigente via união de facto do que via casamento;
  • casamento e divórcio, processos mais complexos, mais onerosos e mais burocráticos do que a união e separação de facto;
  • membros de um casal unido pelo matrimónio mais protegido no divórcio e na morte do que os membros de uma união de facto.

União de facto: o que é e como obter o reconhecimento jurídico

Duas pessoas, independentemente do sexo, vivem em união de facto se vivem em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos.

Em teoria, a união de facto não precisa de reconhecimento. No entanto, o seu reconhecimento produz efeitos importantes na vida a dois. Não tem que ser um registo, como um casamento, mas, no interesse de ambos, a união de facto deve ser provada. Os requisitos a cumprir para o reconhecimento jurídico da união de facto são os seguintes:

  • ter mais de 18 anos à data do reconhecimento da união de facto;
  • não existir demência notória, mesmo com intervalos lúcidos, e situação de acompanhamento de maior estabelecida em sentença, salvo se posteriores ao início da união;
  • nenhum elemento pode ter um casamento anterior não dissolvido, salvo se tiver sido decretada a separação de pessoas e bens;
  • não existir relação de parentesco na linha reta ou no 2.º grau da linha colateral ou afinidade na linha reta;
  • não existir condenação anterior de uma das pessoas como autor ou cúmplice por homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro.

O não cumprimento destas condições impede a atribuição de direitos ou benefícios, em vida ou por morte, fundados na união de facto. 

Reunidos os requisitos para o reconhecimento da união de facto, há que fazer prova da mesma. Entre os meios possíveis, está uma declaração emitida pela junta de freguesia. Para o efeito, desloque-se à sua junta e entregue:

  • uma declaração assinada por ambos, sob compromisso de honra, atestando que vivem em união de facto há mais de dois anos;
  • uma certidão de integral do registo de nascimento de ambos.

O reconhecimento da união de facto vai permitir uma "aproximação ao regime" dos casados, no que se refere à produção de efeitos da união. Com a prova da união de facto, o casal ganha "situação jurídica", que lhe vai permitir assegurar direitos importantes. A lei tem vindo a aproximar, cada vez mais, os direitos dos unidos de facto dos direitos dos cônjuges.

IRS com idêntico enquadramento para os unidos de facto 

Os unidos de facto beneficiam do regime do IRS nas mesmas condições que os sujeitos passivos casados e não separados de pessoas e bens.

Os unidos de facto encontram-se, para efeitos de IRS, no mesmo "grupo" dos casados: "os cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens, ou os unidos de facto, e os respetivos dependentes". Um dos aspetos importantes é, por exemplo, poder beneficiar, se lhe for conveniente, do IRS conjunto.

Direitos no trabalho idênticos aos dos casados

Um casal em união de facto a trabalhar no mesmo local pode beneficiar dos mesmos direitos das pessoas casadas, quanto a férias, licenças, faltas e feriados.

Reconhecimento da paternidade dos filhos fora do casamento

O reconhecimento da paternidade em filhos nascidos de um casamento é automática, isto é, o homem do casal será, pela lei, o pai da criança que nasce. 

No caso da união de facto, não é assim tão simples. Terá que resultar do reconhecimento voluntário do pai (perfilhação) ou de uma declaração do tribunal, após investigação da paternidade. Ainda assim, não havendo o reconhecimento voluntário do pai, a investigação da paternidade está facilitada neste caso, já que assume a presunção de que o pai será quem vivia com a mãe à data da conceção.

Direitos dos filhos da união de facto e do casamento

Atualmente, os filhos nascidos da união de facto têm os mesmos direitos dos filhos de um casamento.

Responsabilidades parentais na união de facto e no casamento

As responsabilidades parentais perante filhos do casal unido de facto são as mesmas dos pais vinculados por casamento. Pai e mãe partilham todas as responsabilidades, como a educação, a saúde, o sustento, a segurança, tal como os pais casados.

Responsabilidades com os filhos na separação de facto e no divórcio

Em caso de separação de um casal em união de facto, tudo se processa como se os filhos fossem nascidos do regime de matrimónio. Os pais devem acordar a partilha de responsabilidades, tais como guarda, educação, sustento, saúde, etc, etc. 

Caso apenas um dos pais pretenda exercer as responsabilidades parentais, terá direito a receber, tal como na situação de divórcio, a pensão de alimentos e a comparticipação em outras despesas. Neste caso, deverá haver recurso ao tribunal.

A divisão de bens na separação de facto 

Contrariamente ao casamento, que prevê diferentes regimes de bens (comunhão de adquiridos, comunhão geral ou separação), a união de facto nada prevê quanto a efeitos patrimoniais. Espera-se que impere o bom senso e a partilha pacífica. Não havendo entendimento, existem os tribunais.

A separação pode acontecer por acordo de ambos ou por vontade de um dos membros. Presume-se que desta relação não decorrem bens sujeitos a partilha, no entanto, nessa altura, o casal pode ter dívidas em nome de um ou de ambos, contas bancárias no nome dos dois, bens de usufruto comum adquiridos pelos dois membros do casal, etc, etc. Há que decidir quem fica com o quê.

Aqui vão aplicar-se regras acordadas em contrato de coabitação, se foi celebrado, ou, na falta dele, as gerais do direito, designadamente as regras aplicáveis a relações obrigacionais.

A situação será geralmente analisada numa ótica de compropriedade, isto é, na proporção do que cada um tiver contribuído.

Pode ainda ser numa perspetiva de enriquecimento sem causa, isto é, à custa do outro. Se um membro adquiriu bens em seu nome, com o dinheiro do outro então, no fim da união, pode entender-se que o bem é de quem forneceu o dinheiro e não de quem comprou e o bem pode ter que lhe ser restituído.

O contrato de coabitação e a casa 

O contrato de coabitação é celebrado entre os membros do casal unido de facto, por escritura pública, num cartório notarial. Neste contrato, o casal pode acordar todas as regras que entender quanto à propriedade de bens que qualquer um tenha adquirido e venha a adquirir, bem como quanto à responsabilidade por dívidas de qualquer um deles.

No caso particular da casa de morada da família, não havendo entendimento prévio, caberá ao tribunal decidir à luz do Código Civil. Com efeito, o art.º 4.º da Lei n.º 7/2001, na sua redação atual, remete a proteção da casa na união de facto para os artigos 1105.º e 1793.º daquele código, com as devidas adaptações.

O princípio é sempre de que o tribunal decidirá tendo em conta a necessidade de cada um, os interesses dos filhos e outros factores relevantes.

Quer se trate de casa arrendada ou não, quem fica a habitá-la é quem mais precisa dela, dada a situação económica, a idade, o estado de saúde, se tem ou não outra casa, entre outros.

No caso de propriedade, de um ou de ambos, o princípio é o mesmo, podendo o não proprietário ou o co-proprietário ficar na casa pagando uma renda ao outro.

Direito a herança na união de facto: o caso particular da morada de família

Contrariamente ao que se passa com o casamento, em que o cônjuge é considerado herdeiro legítimo, na união de facto não é assim.

O direito a herança do membro sobrevivo não existe. Em caso de morte do outro, a herança só pode resultar de testamento legalmente aceite, em que tenha sido expressa a vontade de que parte da quota disponível da herança seja entregue ao membro sobrevivo. Mas existe uma exceção para a casa de morada da família, essa sim, um direito.

Proteção da casa de morada da família em caso de morte

A casa de morada da família está protegida em caso de morte de um dos elementos do casal em união de facto, nos seguintes termos.

Morte do proprietário: o outro membro, que não tenha casa própria no concelho de morada da família, pode permanecer na casa como titular de um direito real de habitação pelo prazo de 5 anos, ou por período igual ao da união, se esta tinha mais de 5 anos à data da morte.

Se o interessado não habitar a casa por mais de um ano, os direitos cessam (salvo se a falta de habitação for devida a motivo de força maior).

O tribunal pode aumentar aqueles prazos, tendo em conta cuidados dispensados pelo membro sobrevivo à pessoa que faleceu ou a familiares deste, e a especial carência em que o membro sobrevivo se encontre, por qualquer causa.

Terminado o prazo, o membro sobrevivo pode manter-se na casa enquanto arrendatário (se o proprietário o permitir e em condições de mercado). Durante o tempo em que habitar a casa, qualquer que seja o momento, ele tem ainda direito de preferência na eventual venda do imóvel.

Casa é propriedade de ambos: a casa passa a ser propriedade do cônjuge sobrevivo. 

Se o interessado não habitar a casa por mais de um ano, os direitos cessam (salvo se a falta de habitação for devida a motivo de força maior).

Morte do arrendatário: o membro sobrevivo beneficia da proteção prevista no artigo 1106.º do Código Civil.

Acesso a prestações sociais do membro sobrevivo em caso de morte

Em caso de morte, o membro sobrevivo da união de facto beneficia, independentemente da necessidade de alimentos, do regime geral:

  • proteção social por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social e da lei n.º 7/2001 ("Medidas de proteção das uniões de facto", na sua redação atual);
  • prestações por morte resultante de acidente de trabalho ou doença profissional, por aplicação dos regimes jurídicos respetivos e da Lei n.º 7/2001;
  • pensão de preço de sangue e por serviços excecionais e relevantes prestados ao país, por aplicação dos regimes jurídicos respetivos e da a Lei n.º 7/2001.

Direito à adoção na união de facto e no casamento

Um casal em união de facto há mais de 4 anos, de sexo diferente ou não, tendo ambos mais de 25 anos, pode adotar uma criança. A diferença de idades entre o adotante e o adotado não deve ser superior a 50 anos (exceto em situações especiais).

A adoção em casados obriga a estas mesmas regras.

Numa situação em que unidos de facto decidam casar e não cumpram ainda o requisito dos 4 anos de casamento, mas cumpram mais de 4 anos em união de facto e casamento, o requisito está preenchido. A lei considera o tempo total de vida em comum. 

O art.º n.º 1979 do Código Civil e este Guia para a adoção da Segurança Social, pode ajudar a tirar outras dúvidas.

Direitos dos unidos de facto na emigração (UE)

Se vive com uma pessoa de forma estável e duradoura, goza de determinados direitos em toda a UE, mesmo se a união não tiver sido registada junto de uma autoridade. Ao decidir ir viver para outro país da UE, esse país deve facilitar-lhe a entrada e a residência. Precisa, no entanto, de provar a sua união. Em cada país as regras para o fazer diferem e não são, muitas vezes, claras. 

Nos países da UE que reconhecem as uniões de facto, também terá direitos e obrigações no que se refere a bens, sucessões e pensões de alimentos em caso de separação. Note que, para casais do mesmo sexo, nem todos os países reconhecem essa união e, como tal, deve informar-se com todo o cuidado.

Tome nota ainda que, em caso de conflito em matéria de regime de bens ou qualquer outra, normalmente a lei aplicável é a do país onde o conflito ocorre. Mais uma vez, deve informar-se de todo o enquadramento legal aplicável à sua relação no país para onde vai viver, para evitar surpresas desagradáveis.

Aquisição da nacionalidade portuguesa pelo casamento e pela união de facto

Um estrangeiro pode adquirir a nacionalidade portuguesa pelo casamento ou pela união de facto, mas os requisitos são mais exigentes no segundo regime:

Pelo casamento: após 3 anos de casamento com um português(a) e mediante declaração feita na constância do matrimónio (mera declaração de vontade). Esta mantém-se ainda que o casamento seja declarado nulo.

Pela união de facto: após 3 anos de união de facto com português(a) e após ação de reconhecimento, a interpor no tribunal cível (tem que haver sentença judicial reconhecendo a união de facto).

O reconhecimento judicial na união de facto pretende diminuir o risco de abusos e fraudes. Em causa está o direito a cidadania europeia que se adquire com a nacionalidade portuguesa, com todos os benefícios associados.

Como desfazer, juridicamente, a união de facto

A união de facto dissolve-se com o falecimento de um dos membros, por vontade de um dos membros ou com o casamento de um dos membros.

Para reverter esta situação jurídica, à semelhança do que se fez para a formalização, deve-se apresentar uma outra declaração na junta de freguesia declarando, sob compromisso de honra, a data em que a união de facto terminou. Não é preciso concordância de ambos, basta um elemento do casal apresentar a declaração.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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