Quando, num casal, nenhum dos elementos recebe 95% ou mais, do rendimento total do casal, os dois trabalhadores são classificados, para efeitos fiscais, como "casados, dois titulares de rendimento".

Se um receber mais do que 95% do rendimento total, ele será "casado, único titular de rendimento"

Esta definição determina a tabela de retenção na fonte de IRS que é aplicável mensalmente, a cada um dos elementos do casal (ou unidos de facto).

O que é ser "titular de rendimento"

Um titular de rendimento para efeitos fiscais é, de forma simples, alguém que tem rendimentos em Portugal sujeitos a tributação em sede de IRS.

Para que serve a classificação de "casado, único titular" ou "casado, 2 titulares"

Esta é uma classificação fiscal, que serve para enquadrar os contribuintes casados nas tabelas de IRS, que contêm as taxas de retenção na fonte de IRS. É de acordo com esta classificação que a entidade patronal "retém" IRS dos trabalhadores ou, diretamente, o Estado, no caso dos pensionistas.

Assim, nos titulares de rendimento casados ou unidos de facto:

  1. Um dos elementos é "casado, único titular", quando só ele recebe rendimentos: sobretudo, quando um dos elementos do casal não tem rendimentos, ou são isentos de tributação por serem muito baixos.
  2. Os dois elementos são "casado, único titular", quando ambos recebem, mas um deles recebe 95% ou mais do rendimento englobado do casal.
  3. Os dois elementos são "casados, dois titulares" quando nenhum dos rendimentos, individualmente, representa 95% ou mais do rendimento total do casal.

Eis alguns exemplos com trabalhadores dependentes:

  1. O Francisco recebe um ordenado bruto mensal de 2.000 e a Mafalda, a sua mulher, recebe também 2.000. Cada um recebe 50% do rendimento total: nas empresas onde trabalham, cada um está registado como "casado, 2 titulares".
  2. A Leonor recebe um salário bruto de 3.000 e o Pedro recebe 1.500. O salário do casal é de 4.500, e os 3.000 da Leonor representam 67% do rendimento do casal. Fiscalmente, para efeitos de retenção na fonte nas 2 entidades patronais, são ambos "casados, 2 titulares".
  3. O Vasco recebe 8.100 e a Ana recebe 900. O rendimento de ambos é de 9.000, em que o Vasco recebe 90% do total. São ambos "casados, 2 titulares", para efeitos da retenção na fonte nas empresas onde trabalham.
  4. A Maria recebe 10.000 e António recebe 500 num part-time. São classificados como "casado, único titular". Neste caso, o rendimento do António até está isento, pois não atinge o mínimo para retenção na fonte de IRS em 2023 (762 euros).

E exemplos com situações de emprego no estrangeiro, desemprego, pensões ou trabalhadores independentes:

  1. O João recebe um ordenado bruto de 2.000 e a Catarina, a sua mulher, está desempregada. O Pedro, na sua empresa, para efeitos de IRS, é "casado, único titular".
  2. O Pedro recebe 1.500 euros e a Isabel recebe 1.500 euros, mas trabalha noutro país da UE. Só o Pedro é titular de rendimento em Portugal: é "casado, único titular".
  3. O Luís é trabalhador por contra de outrem e a Luísa, sua mulher, é trabalhadora independente. O Luís, na empresa onde trabalha, está registado como: "casado, 2 titulares", para efeitos de retenção de IRS.
  4. O David está reformado e recebe uma pensão. A Teresa, sua mulher, recebe subsídio de desemprego. A situação do David, perante o Estado, que lhe paga a reforma, é de: "casado, único titular".
  5. A Sara e o Rui são trabalhadores a recibos verdes. Não há classificação fiscal do Rui ou da Sara nas empresas onde prestam serviços.

As taxas de retenção na fonte dos trabalhadores independentes são definidas por atividade e, na maior parte dos casos, a taxa é de 25%. O desconto mensal para o IRS não segue as tabelas de retenção na fonte de IRS dos trabalhadores por conta de outrem.

É independente, por exemplo, do n.º de titulares de rendimento, do n.º de dependentes, se é casado ou não, se está no continente, na Madeira ou nos Açores. Estes aspetos são importantes na hora de apurar o imposto devido (anualmente), mas não para efeitos do desconto mensal para IRS.

Normalmente, os trabalhadores a recibos verdes prestam serviços a várias empresas. A retenção de IRS que queiram fazer, ou que estejam obrigados a fazer, é assinalada no recibo verde que emitem. A empresa que paga os honorários, retém o montante de imposto e entrega-o ao Estado. E o trabalhador recebe o valor da sua prestação de serviços já abatida (líquida) do imposto.

Casado dois titulares ou casado único titular: quais as implicações

O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares é aplicado aos contribuintes singulares, titulares de rendimentos sujeitos a tributação em Portugal. Há um nível a partir do qual se retém imposto. Rendimentos muito baixos não fazem descontos mensais (em 2023, os rendimentos mensais até 762 euros, estão isentos de retenção na fonte).

A classificação de casado, único titular, ou dois titulares, nos trabalhadores dependentes ou pensionistas releva, então, para aquele "adiantamento" mensal por conta do IRS que se há-se pagar no ano a seguir. As taxas de retenção constam das tabelas de retenção na fonte de IRS.

A metodologia para apurar a retenção na fonte de IRS alterou-se no 2. semestre de 2023. O desconto mensal passa a ser mais aproximado da situação de cada contribuinte e do efetivo imposto que se há de pagar em 2024. Isso é conseguido com uma lógica de taxas marginais, semelhantes aos escalões de IRS anual.

Contrariamente ao que acontecia até aqui, em que em cada tabela tinha o número de dependentes, agora, as próprias tabelas são diferentes para quem tem e para quem não tem dependentes.

Vamos comparar, então, as tabelas de IRS (continente) para os "casados, único titular" e "casados, 2 titulares". Teremos que apresentar 4 tabelas, para contemplar os que não têm e os que têm dependentes.

Começamos por comparar os contribuintes sem filhos, na situação "2 titulares" e "único titular":

Tabela IRS de casados 2 titulares sem dependentes. comparação da situação de casados

Tabela IRS de casados único titular sem dependentes. comparação da situação de casados

O que se constata é que, quer as taxas marginais máximas quer, por consequência, as taxas efetivas, são maiores para os casados, dois titulares, do que para os casados, com um único titular.

Mas, como se calcula agora a retenção na fonte? Aplique a seguinte fórmula:

Retenção de IRS = remuneração bruta mensal (R) x taxa marginal máxima - parcela a abater

Como o cálculo é feito pela taxa máxima (correspondente a quem está no limite superior do escalão), o "ajustamento" faz-se pela subtração de uma parcela. Assim sendo, a taxa implícita no seu IRS mensal vai ser, efetivamente, menor. Por isso, também aqui, o Estado apresenta as taxas efetivas de IRS para o limite superior do escalão, para nossa orientação.

Para a calcular, faça: Taxa efetiva de IRS = retenção de IRS ÷ remuneração bruta

Damos um exemplo, o João é "casado, 2 titulares" e o António é "casado, único titular". Ambos ganham 1.500 € / mês (remuneração sujeita a IRS).

As contas do João (2 titulares), pela Tabela I:

  • escalão até 1.600,36 €; taxa marginal 28,5%; parcela a abater 191,23 €
  • IRS = 1.500 x 28,5% - 191,23 = 236,00 €
  • taxa efetiva de IRS do João: 236 ÷ 1.500 = 15,7%

As contas do António (único titular), pela Tabela IV:

  • escalão até 1.700,36 €; taxa marginal 21%; parcela a abater 156,03 €
  • IRS = 1.500 x 21% - 156,03 = 158,00 €
  • taxa efetiva de IRS do António: 158 ÷ 1.500 = 10,5%

Como se comprova, não só a taxa marginal máxima é mais alta para "casado dois titulares" como, naturalmente, também é superior a taxa efetiva de IRS (a taxa implícita no imposto que é pago).

Comparamos agora as taxas dos casados (2 titulares e único titular) com dependentes:

Tabela IRS de casados 2 titulares com um ou mais dependentes: comparação da situação de casados

Tabela IRS de casados único titular com dependentes. comparação da situação de casados

A conclusão é exatamente a mesma, ou seja:

  • taxas marginais e (naturalmente) taxas efetivas de IRS mais elevadas para os "casados, dois titulares" face aos casais em que apenas um tem rendimentos.

Voltamos ao exemplo do João e do António, aproveitando para mostrar como se aplicam as tabelas com dependentes. Aqui há um "bónus" por dependente. Já existia antes, mas com este novo método é mais evidente.

Quem tem filhos deduz uma parcela adicional por cada filho (repare que estas tabelas têm uma coluna com uma parcela adicional por dependente).

Vamos supor agora que o João e o António têm ambos, 2 filhos.

As contas do João (2 titulares; 2 filhos), pela Tabela III:

  • escalão até 1.600,36 €; taxa marginal 28,5%; parcela a abater 191,23 €; parcela a abater por dependente 21,43€
  • IRS = 1.500 x 28,5% - 191,23 - 2 x 21,43 = 193 € (se o João tivesse 1 filho, a parcela adicional a abater seria 1 x 21,43 €)
  • taxa efetiva de IRS do João: 193 ÷ 1.500 = 12,9%(entre 9,3% e 15,2% porque o João ganha entre 1.106,93 € e 1.600,36 €)

As contas do António (único titular; 2 filhos), pela Tabela V:

  • escalão: até 1.600,36 €; taxa marginal 21%; parcela a abater 144,78 €; parcela a abater por dependente 42,86 € (o dobro da anterior)
  • IRS = 1.500 x 21% - 144,78 - 2 x 42,86 = 84,00 €
  • taxa efetiva de IRS do António: 84 ÷ 1.500 = 5,6%(entre 4,1% e 9,3% porque o António ganha entre 1.106,93 € e 1.600,36 €)

Ou seja, as diferenças são mais notórias ainda quando existem dependentes: 12,9% para casados, 2 titulares e 5,6% para único titular. E isto é natural, um único titular de rendimentos com dependentes terá que ser "menos penalizado" do que quando existem duas pessoas com rendimentos no mesmo agregado, com dependentes.

Conclusões:

  1. Casados dois titulares, descontam mais IRS do que os contribuintes casados com apenas 1 titular de rendimentos.
  2. A diferença no pagamento de IRS é mais evidente quando existem dependentes a cargo. Quando apenas um é titular, o seu IRS é bastante "desagravado" face aos casados, 2 titulares.
  3. Quanto mais dependentes, menor a taxa de IRS (a parcela adicional a abater é multiplicada pelo n.º de dependentes).
  4. Com as tabelas atuais, só faz sentido falar de taxas efetivas de IRS. O cálculo pela taxa marginal máxima é apenas o referencial para o limite superior de cada escalão que, depois, é "corrigido" pelas parcelas a abater. Só o cálculo final releva e, portanto, só a taxa efetiva implícita no cálculo final é que deve ser comparada.

Esteja atento à sua taxa efetiva de IRS. Ela deve constar dos recibos de vencimento a partir de 1 de julho de 2023.

Consulte ou grave, em excel ou pdf, as Tabelas de retenção na fonte de IRS em vigor no 2.º semestre de 2023 e visite os nossos exemplos de como calcular o desconto mensal para o IRS no 2.º semestre de 2023.

Se não trabalha por conta de outrem, saiba como é feita a retenção na fonte dos trabalhadores independentes.

Subsídio de desemprego paga IRS?

O subsídio de desemprego, como outras prestações sociais não estão sujeitas a tributação. Como este, também o RSI ou o Abono de Família, são consideradas prestações sociais, pagas pela Segurança Social, isentas de imposto.

Se apenas um dos elementos do casal recebe rendimentos, porque o outro está desempregado, com subsídio de desemprego, então o primeiro está na situação fiscal de "casado, único titular". Deve-o comunicar à entidade patronal para que ela lhe aplique a tabela correta de retenção na fonte.

Se a situação mudar, algures no decorrer do ano, a informação deve ser atualizada na entidade patronal.

Um cônjuge recebe pensão e outro trabalha: casado, único titular?

Não, por regra são ambos titulares. As pensões são rendimentos sujeitos a tributação e, como tal, há retenção na fonte mensal. Os dois elementos do casal, o que está no ativo e o que recebe pensão, estão ambos na situação de "casado, dois titulares".

O desconto mensal de IRS será determinado pelas Tabelas de IRS para pensionistas em 2023 (atualizadas 2.º semestre de 2023).

No entanto, nos casos de pensões muito baixas, pode haver isenção de IRS, isto é, não estar sujeito ao pagamento de imposto. Isso acontece em 2023, nas pensões até 762 euros mensais. Nesse caso, não há retenção na fonte de IRS mensal e o cônjuge no ativo é "casado, único titular".

Os titulares de pensões, viúvos, fazem retenção na fonte pela tabela de pensões, na categoria de "não casados".

Casado um titular vs dois titulares: dá para escolher?

Não. O trabalhador deve comunicar a sua real situação familiar à área de recursos humanos da empresa onde trabalha, para que esta lhe faça os descontos de IRS corretos e comunique informação fidedigna à Autoridade Tributária.

O "casado, único titular" desconta menos. Mensalmente, compensaria esta opção: menos imposto, mais dinheiro na carteira. Mas, no final, o imposto devido, apurado para a situação real (2 titulares), seria muito diferente do somatório das retenções na fonte que fez ao longo do ano. Note que a sua situação perante a Autoridade tributária não se altera, o imposto anual a pagar é o da sua real situação tributária, que a AT conhece.

Adiantando menos ao longo do ano teria, provavelmente, uma conta significativa de imposto para pagar ao Estado no ano seguinte, aquando da entrega da Declaração de IRS. Além disso, estaria a prestar falsa informação.

Se tem rendimento tributável, não esqueça, se o Estado lhe apura um imposto de 100, vai pagá-lo de qualquer das formas, adiantando mais ou menos mensalmente. No fim do processo, os 100 estarão nos cofres do Estado.

Saiba mais sobre como funciona o IRS em Escalões do IRS 2022: qual o seu e quanto vai pagar em 2023 ou conheça os escalões e taxas aplicáveis aos rendimentos que recebe em 2023 (para apuramento do imposto em 2024) em Escalões do IRS 2023: saiba quais são e como se aplicam.

Paula Vieira
Paula Vieira
Economista pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto. É consultora em processos de fusão e aquisição de empresas, finanças e gestão.