Emprego

Como calcular o valor a receber quando se demitir

Embora não haja lugar a indemnização, tem direito ao proporcional dos subsídios de férias e Natal.

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Como calcular o valor a receber quando se demitir

Embora não haja lugar a indemnização, tem direito ao proporcional dos subsídios de férias e Natal.

Quando o trabalhador rescinde o contrato de trabalho por sua iniciativa, vai ter direito a um montante de acerto de contas, relacionado com férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e horas de formação.

Que valores vou receber se me demitir?

Sem justa causa, não há lugar a indemnização nem a subsídio de desemprego, sendo este último só aplicável a desemprego involuntário. Mas há contas finais a fazer e montantes a receber:

  • os dias de férias não gozados, a que tem direito desde o primeiro dia do ano civil em curso (as férias que se venceram a 1 de janeiro e cujo direito foi ganho pelo trabalho do ano anterior);
  • o subsídio de férias correspondente a essas férias vencidas e não gozadas;
  • o proporcional das férias, referente ao ano de cessação;
  • o proporcional do subsídio de férias, referente ao ano de cessação;
  • o proporcional do subsídio de Natal, referente ao ano de cessação;
  • o equivalente às horas de formação que ainda não se tenham convertido em crédito de horas, ou o crédito de horas de formação que ainda não tenha "expirado".

Exemplo prático 1: como calcular os valores a receber

Imaginemos que a Maria encontrou um emprego melhor e decidiu rescindir o seu contrato de trabalho em 31 de março de 2021. Temos os seguintes dados sobre a Maria:

  • a Maria é casada e tem dois filhos;
  • início do contrato: 1 de setembro de 2015;
  • em 2021 trabalhou 90 dias (30x3);
  • salário base e diuturnidades: 2.000 euros;
  • horas trabalhadas por semana: 40h
  • salário / hora = 2.000 x 12 / (52 x 40 h) = 11,54 €
  • dias de férias a que tem direito em 2021: 22 dias, mas já gozou 10 dias em fevereiro (falta-lhe gozar 12 dias);
  • quando fez férias em fevereiro não recebeu o correspondente subsídio de férias;
  • o empregador proporcionou as horas de formação previstas na lei em todos os anos, exceto em 2018, onde apenas foram dadas 20 horas de formação das 35 obrigatórias à data.

Valores brutos a receber no acerto de contas:

  • dias de férias vencidas e não gozadas: 2000 € x 12 / 22 = 1.090,91 €;
  • subsídio de férias correspondente a férias vencidas a 1 de janeiro, do qual ainda nada tinha recebido: 2.000 €;
  • proporcional de férias de 2021: (2.000 € x 90) / 365 = 493,15 €;
  • proporcional de subsídio de férias de 2021: 493,15 €;
  • proporcional do subsídio de Natal de 2021: 493,15 €;
  • crédito de horas de formação: 15 x 11,54 € = 173,01 €

Tudo somado, o valor bruto a receber pela Maria, seria assim de 1.090,91 € + 2.000 € + 3 x 493,15 € = 4.570,36 €, ao que acresce 173,10 € de créditos de formação.

Receberia um total bruto de 4.743,46 €.

Falamos aqui de acerto de contas.Naturalmente, o salário da Maria também é devido até ao dia da cessação do contrato, pelo que receberá igualmente o seu salário inteiro de março. Se saísse a meio do mês, ou em qualquer outra data de março, receberia o proporcional desse salário.

Note que:

  • se a Maria, em 2021, não tivesse gozado férias, receberia, por inteiro, os 2.000 € equivalentes aos 22 dias de férias;
  • se, quando a Maria fez férias, tivesse recebido parte do subsídio de férias, à data da saída receberia o remanescente;
  • as horas de formação em falta em 2018, pela lei, converteram-se em créditos de formação dois anos depois, mas não foram usados. Como ainda não passaram três anos para utilização desses créditos, a Maria terá direito a receber, em dinheiro, um montante equivalente às 15 horas em falta.

Atualmente, as horas de formação que devem ser proporcionadas ao trabalhador são de 40 horas (antes eram 35 horas). No que se refere a esta componente, cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber o equivalente à parte das 40 horas de formação que não teve, ou ao crédito de horas para formação de que seja titular, à data da cessação (art.º 134.º do Código do Trabalho, CT).

Nos contratos a termo, por período igual ou superior a três meses, o número de horas a que o trabalhador tem direito nesse ano, deve ser calculado de forma proporcional às 40 horas anuais.

Deverá ainda ter em conta o que refere o CT, nos art.ºs 131.º a 134.º:

  • O trabalhador tem direito, em cada ano, a um número mínimo de quarenta horas de formação contínua ou, em contratos a termo por período igual ou superior a três meses, a um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato nesse ano;
  • Se as 40 horas de formação não forem dadas pelo empregador até dois anos após o seu vencimento, transformam-se em crédito de horas para formação;
  • O crédito de horas pode ser usado pelo trabalhador, para formação por sua iniciativa, sendo que esse crédito cessa se não for utilizado, passados três anos sobre a sua constituição.

Ou seja, as horas de formação ainda não convertidas em crédito de horas, ou o crédito de horas que ainda não tenha "expirado", converte-se em dinheiro na hora da saída. Tudo vai depender do prazo que passou sobre o direito às horas de formação, ou sobre o crédito de horas, na data de saída:

  • se ainda não passaram os dois anos sobre o direito às 40 horas (ou às 35, conforme a lei em vigor à data do direito) e a formação não foi dada, esse crédito transforma-se em dinheiro na hora de saída;
  • se passaram mais de dois anos e a formação não foi dada, ela transformou-se num crédito de horas de formação, a usar pelo trabalhador, "expirando" esse direito passados três anos sobre a data em que o crédito de horas se constituiu:
    • se a saída se dá dentro do período de três anos após a constituição do crédito, o trabalhador terá direito à conversão em dinheiro;
    • se a saída se dá depois dos três anos, esse crédito, ou o direito do trabalhador terá já expirado.

No exemplo apresentado, o número mínimo legal é de 35 horas, pois refere-se a 2018. Se fosse em 2020, por exemplo, o mínimo de horas legal já seria de 40 horas, dado que a lei se alterou em finais de 2019.

Tenha em consideração que este é um exemplo teórico e pode ter variações para a realidade. A pandemia por Covid-19 pode ter impedido as empresas de proporcionar a formação obrigatória, designadamente no decurso de 2020.

Em situações em que o ano de 2020 esteja em causa poderá, eventualmente, não haver lugar a qualquer compensação ou chegar a um acordo diferente com a empresa.

Por fim, note ainda que este não é um tema consensual entre empresas e trabalhadores e pode haver divergências de entendimento. Não havendo acordo quanto a esta matéria, o mais seguro será sempre recorrer a ajuda especializada, designadamente um advogado da área do direito do trabalho. Na hora de saída, é muito comum que esta componente não faça parte.

Valor líquido a receber após apuramento de impostos

Voltando ao nosso exemplo, há que aplicar agora os impostos devidos:

Segurança Social: 4.743,46 x 11% = 521,78 €

IRS (com base nas tabelas de retenção em vigor em 2021 para casados, dois dependentes): 4.743,46 x 31,9% = 1.513,16 €

Total líquido a receber: 4.743,46 - 521,78 - 1.513,16 = 2.708,52 €

Mais uma vez, alertamos que estamos dedicados a componentes de acerto de contas. O salário de 2.000 euros de março, deve ser adicionado ao global a receber, para efeitos de cálculo de impostos.

Exemplo prático 2: como calculo o valor de horas de formação em anos incompletos?

Embora a lei não seja explícita neste caso, dita o bom senso e a justiça que, em anos não completos, se apliquem proporcionais.

Consideremos o exemplo do Pedro que, no ano em que pede rescisão do contrato, trabalhou metade do ano e não teve formação.

Ora, com uma lei de 40 horas de formação, o natural é que o João tenha direito a receber, em dinheiro, o equivalente a apenas 20 horas de formação não proporcionadas pelo empregador.

Para o tratamento das horas de formação, convirá sempre ter o salário / hora.

Se o Pedro ganha 1.500 € / mês e trabalha 40 horas por semana, então ganha 1.500 x 12 / (52 x 40 h) por hora, ou seja, 8,65 €.

Então 8,65 x 20 = 173,08 €

Este cálculo proporcional deve igualmente aplicar-se nos anos de entrada que não sejam completos e, desde que, conforme aplicável, as horas de formação ou os créditos de horas de formação não tenham já "expirado".

Exemplo prático 3: se falhar o período de aviso prévio, vou receber o mesmo?

O aviso prévio é a comunicação que tem que fazer ao empregador sobre a sua decisão de saída, o qual deve respeitar uma antecedência mínima legal. Se não a respeitar vai ter que compensar a empresa.

Este período a cumprir varia conforme o tipo de contrato e a antiguidade do contrato:

  • 30 dias para contrato sem termo, para antiguidade inferior a dois anos;
  • 60 dias para contrato sem termo, com mais de dois anos de antiguidade;
  • 15 dias para contrato a termo certo, com duração inferior a seis meses;
  • 30 dias para contrato a termo certo, com duração igual ou superior a seis meses;
  • 15 dias para contrato a termo incerto, se o contrato ainda não tiver durado seis meses;
  • 30 dias para contrato a termo incerto, se o contrato durar há mais de meio ano.

O aviso prévio significa a forma (a carta a enviar) mas também, em substância, o período de tempo a dar ao empregador para que ele prepare a sua substituição.

Imaginemos que o João tem um contrato sem termo e trabalha na empresa há cinco anos. Vai ter de cumprir o aviso prévio com antecedência mínima de 60 dias, ou seja, dois meses. Se o João enviar esta comunicação ao empregador com apenas um mês de antecedência, terá que ressarcir a empresa em um mês de salário (equivalente ao mês em falta do aviso prévio).

Numa situação de urgência em cessar o contrato, sob pena de se perder uma grande oportunidade de emprego, pode passar-se por cima do aviso prévio e pagar o período correspondente à empresa. Neste caso, seriam dois meses de salário que seriam abatidos aos valores a receber.

Convirá sempre ter um diálogo claro e transparente com a empresa e, eventualmente, até chegar a um acordo quanto à forma de tratar este período e o correspondente pagamento à empresa.

Normalmente, sempre que tal é possível, usam-se férias não gozadas para encurtar o período.

Os prazos apresentados são para rescisão sem justa causa pelo trabalhador. Na rescisão com justa causa, pode haver ou não lugar a pagamento de indemnização, para além dos tais acertos de contas de que aqui falamos. A comunicação ao empregador é feita no prazo de 30 dias sobre os factos que deram origem à justa causa.

Exemplo prático 4: como fazer os cálculos se gozar férias e trabalhar em parte do período de aviso prévio?

Se não houver inconveniente para o seu trabalho, nomeadamente para a passagem de funções, poderá informar, no aviso prévio, que vai gozar férias nesse período ou em parte dele.

Tomemos agora o seguinte exemplo: pretende rescindir o contrato e está há menos de dois anos na empresa. O aviso prévio terá que ser feito com 30 dias de antecedência.

Imaginemos que:

  • recebe 1.000€ de salário;
  • faz a denúncia do contrato com aviso prévio, com data de 14 de janeiro;
  • o período de aviso prévio decorre de 15 de janeiro a 13 de fevereiro, ambos inclusive (30 dias);
  • goza férias entre 1 e 13 de fevereiro (14 dias de um total de 22 dias de férias vencidas a 1 de janeiro, a que tem direito).

Ora, como calcular o valor de férias vencidas e não gozadas e o correspondente subsídio de férias?

Neste caso, terá que receber, em dinheiro, o correspondente aos oito dias de férias não gozadas: 1.000 x 8 / 22 = 363,64 €.

Assumindo que, quando saiu para férias, não recebeu parte do subsídio, então vai juntar-lhe ainda um subsídio de férias por inteiro (1.000 €).

E o que se passa com o salário de janeiro e fevereiro?

A rescisão do contrato só acontece a 13 de fevereiro. Até lá o seu salário não está em causa. Neste caso, receberia o salário de janeiro e parte do salário de fevereiro (proporcional aos 13 dias ao serviço da empresa).

Depois, como vimos no primeiro exemplo, receberia as demais parcelas referentes aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal do ano em curso, bem como horas de formação em falta, se fosse o caso.

Note, por fim, que todos os exemplos apresentados neste artigo são ilustrativos, não contemplando todas as situações, nem possíveis especificidades de cada caso. Os valores apresentados nos exemplos são arredondados por simplificação.

O simulador de compensação da ACT

A Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) disponibiliza um simulador de compensação a receber, para os casos em que é o trabalhador a cessar o contrato, e para aqueles em que é o empregador a fazê-lo (despedimento).

Se usar o simulador para saber o que vai receber se rescindir o contrato, tenha em consideração que este não entra em linha de conta com as eventuais horas de formação ou crédito de horas a receber. Também não calcula os impostos a pagar, pelo que o valor apresentado é ilíquido / bruto.

Ao usá-lo, não se esqueça de:

  • selecionar quem rescinde o contrato: empregador ou trabalhador;
  • selecionar o tipo de contrato (indeterminado ou sem termo, a termo certo ou incerto);
  • a data em que assinou e a data em que vai cessar o contrato;
  • na retribuição, separar a retribuição base (salário base), eventuais diuturnidades e outros complementos do ordenado;
  • nas férias, vencidas a 1 de janeiro do ano em que sai (referentes a um direito do ano anterior), indicar os dias já gozados e a parte, ou totalidade, do subsídio de férias já recebido.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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